"Deu um plantão no Eufrásia de 40 anos, sem nunca tirar qualquer período de férias e não se afastar nem nos finais de semana. Atendia qualquer pessoa a qualquer hora do dia e da noite, com pagamento ou não" - afirma Hélio de Almeida Pinto Filho, empresário do ramo de móveis e eletrodomésticos, acrescentando que o pai dormia ao lado do telefone "que era atendido no máximo ao segundo toque."
O motorista predileto, taxista José Pardal Gomes, o Zé Bolão, confirma a história das
"corridas" a lugares remotos, na área rural, para atender a chamadas, e que ao perceber a situação financeira do paciente, Hélio dizia: - É Zé, desse aí não dá para cobrar não. Compensava cobrando dos ricos. Uma espécie de Robin Hood, que deixava o filho intrigado: - Ué, pai, o senhor que é lacerdista, de direita, age como um socialista?
E é Helinho, o filho, quem afirma: "Tinha uma invulgar capacidade profissional pois o pouco tempo que lhe sobrava era dedicado aos estudos. Doutor Hélio, indubitavelmente, honrou integralmente o juramento de Hipócrates". E o empresário Eduardo Motta confirma: "Tia Dudinha veio desenganada do Rio nos anos 50, com diagnóstico de câncer generalizado. Veio para morrer.
- Mas eles a abriram para ver onde está? - teria indagado o médico de Vassouras, numa época onde só o RX revelava alguma coisa do interior do corpo do paciente, acrescentando: - Acho um absurdo terem dado esse diagnóstico". Em seguida, ainda segundo Eduardo, doutor Hélio "abriu, tirou útero, ovário, extirpou os tumores..." Morreram os irmãos, já velhos, e Dudinha só veio a falecer com quase 90 anos.
"Vocês vão sentir"(a falta)
"Tinha um conhecimento anatômico excepcional". Foi um ícone reconhecido mundialmente: em primeiro lugar em número de cirurgias e em segundo em número de êxitos" - ajunta o empresário, citando uma revista estrangeira especializada.Nascido em Mar de Espanha (MG), em 23 de janeiro de 1915, faleceu em 19 de agosto de 1979, com 64 anos de infarto. Como seu mestre, professor Maurity Santos," na época um dos maiores cirurgiões do Brasil", de acordo com Helinho, e que morreu de apendicite aguda, parecia esquecer de cuidar da própria saúde. Formou-se na Faculdade Nacional de Medicina, no Rio de Janeiro, turma de 1939, depois de passar em terceiro lugar no vestibular. Completou os estudos no Hospital da Gamboa, também na capital carioca, "no serviço do professor-doutor Maurity".
"Abalado com a morte do professor e amigo, foi trazido pelo irmão Luiz Pinto, também médico, para a Santa Casa de Valença, sendo logo depois trazido pelo irmão e um grupo de médicos para a inauguração do Hospital Eufrásia Teixeira Leite, onde ficou como diretor-médico até falecer", como conta Helinho. "Daqui pra frente vocês vão ver quem foi doutor Hélio, vocês vão sentir" - recorda o motorista Zé Bolão, a predição realizada na ocasião. "Pela seriedade dos atendimentos, nos momentos de dificuldade financeira, o que salvava o Eufrásia era a confiança depositada no trabalho de doutor Hélio e toda sua equipe (onde figurava, como fiel escudeiro, José Ferreira de Souza, o enfermeiro) pelos grandes empresários da cidade, como Chiquinho Ibrahim, Júlio Avelino e Osterno Aguiar".
São tantas as histórias fantásticas, sobre cirurgias bem sucedidas, "sua invulgar cultura geral" e a forte personalidade, que teriam de continuar a ser contadas em seguidos capítulos. Uma delas dá conta que considerava a presença nos bancos proibida aos médicos, convicção levada ao ponto de se negar a adentrar um deles para receber a devolução de seu imposto de renda.
Pedro Paulo de Miranda
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